Diacetil
A primeira lembrança que te vem à cabeça quando você prova uma cerveja com essa falha é uma sessão de cinema. Hoje vou falar sobre um off flavor que deixa um “cheiro de manteiga de pipoca no ar”: diacetil.
O diacetil é uma falha na cerveja que quase todo o cervejeiro caseiro conhece, já provou alguma cerveja com esse off flavor, ou pelo menos já ouviu falar.
Ele está presente em alguma concentração em todas as cervejas, já que é resultado do processo de fermentação.
Mas nem sempre quando ele é percebido é sinal de que algo deu errado na sua cerveja. Por exemplo em uma Pilsner, o diacetil faz parte do perfil de sabor – aliás, ele é uma espécie de “marca registrada” da Pilsner Urquell, uma das mais conhecidas representantes comerciais do estilo.
Neste post vou mostrar como é percebido o diacetil, como ele se forma na sua cerveja, o que causa esse off flavor e como você pode evitar ele na sua cerveja. Também vou falar sobre os estilos em que a sua presença, em baixos níveis, é bem-vinda.
Como o diacetil é percebido na cerveja?
A descrição mais perfeita para o aroma provocado pelo diacetil na cerveja é esta: “cheiro de pipoca sabor manteiga para micro-ondas”.
Uma cerveja com essa falha apresenta sabor e aroma semelhantes ao da manteiga e pode deixar uma sensação de ranço na boca – normalmente quando as concentrações de diacetil são mais altas. Em níveis mais baixos, esse composto é associado ao gosto de bala toffee ou de caramelo na cerveja.
A presença do diacetil normalmente é mais evidente nas cervejas claras de baixa fermentação, e só com muita dificuldade é percebida em cervejas escuras mais robustas.
Como o diacetil se forma na cerveja?
Essa explicação não é muito divertida, mas é necessária pra você entender o que eu vou falar daqui em diante.
Então vamos lá…
Durante a fermentação, as leveduras produzem álcool, gás carbônico e diversos outros elementos – entre eles, um aminoácido chamado valina. Na produção da valina se forma um composto intermediário chamado acetolactato.
Esse é o cara que você deve temer! Guarde o nome dele: acetolactato, precursor do diacetil!
O que acontece é que nem todo o acetolactato chega a se transformar em valina. Uma parte dele fica livre e cheia de más intenções na sua produção. Numa reação de oxidação, favorecida pelas altas temperaturas, o acetolactato é convertido em diacetil. E o resto da história você já sabe…
A parte boa de tudo isso é que no final da fermentação as próprias leveduras reabsorvem e convertem o diacetil (2,3-butanodiona) em acetoína e depois em 2,3-butanodiol. Esses compostos têm limiares de percepção de sabor altos e, por isso, não interferem tanto no sabor da cerveja
Quanto mais alto o limiar, mais difícil de se detectar o sabor.
Resumindo, é como se a levedura produzisse o veneno e o antídoto durante a fermentação. Por sorte, a capacidade dela de reabsorver o diacetil é cerca de dez vezes maior que a de formar o composto.
Mas isso é quando tudo dá certo… E quando não dá?
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Quais as causas do off flavor?
Você já sabe que o aroma de manteiga na cerveja é causado pela presença do diacetil. Mas você pode estar se perguntando: Ele não é reabsorvido pelas leveduras?
Pois é… As vezes o processo não funciona tão bem assim. E mesmo quando a fermentação é muito bem feita, ainda pode aparecer um outro inimigo da cerveja: a contaminação.
Para quem quiser relembrar, tem um post aqui no blog sobre 5 fatores chave para uma boa fermentação que vale a pena conferir.
Veja só o que pode ocasionar essa falha na sua cerveja:
- escolha de uma cepa de leveduras inadequada (as diferentes cepas produzem níveis variados de diacetil. Se, por exemplo, você escolheu determinada cepa para conseguir certo perfil sensorial na cerveja, pode ser necessário fazer um ajuste e usar uma opção que produza menos diacetil ou que tenha maior capacidade de reabsorvê-lo);
- uso de leveduras com baixa vitalidade (comum em produtos fora do prazo de validade);
- exposição do mosto ao oxigênio durante a fermentação;
- atraso de fermentação ocasionado por aeração insuficiente ou pelo uso de fermentos impróprios (esse atraso provoca a produção de uma quantidade excessiva de diacetil, que a levedura não consegue reabsorver depois);
- fermentação em baixas temperaturas no final do processo;
- diminuição muito rápida e brusca da temperatura (cold crash) antes do fim da fermentação para fazer a clarificação.
- insuficiência de nutrientes para as leveduras no mosto (nesse caso, as leveduras produzem os nutrientes por conta própria e, nesse processo, dão origem ao temido acetolactato!);
- contaminação por bactérias ácido-láticas, especialmente Pediococcus, Streptococcus e Lactobacillus (que também produzem diacetil).
Como evitar ou controlar o diacetil?
Vou te ensinar agora o que você pode fazer para minimizar a ocorrência desse off flavor na cerveja:
- escolher cepas de leveduras que não produzam muito diacetil;
- usar leveduras sadias e em quantidade adequada (taxa de inóculo adequada);
- reduzir a temperatura da fermentação primária;
- elevar a temperatura perto do fim da fermentação;
- assegurar uma quantidade suficiente de nutrientes para as leveduras no mosto;
- oxigenar bem o mosto antes da fermentação;
- evitar a entrada de oxigênio no balde depois que a fermentação começar;
- ter muito cuidado com a sanitização para evitar contaminações.
Lembre de fazer o descanso de diacetil!
Depois que o mosto estiver totalmente atenuado, uma etapa importante para evitar esse off flavor, especialmente nas Lagers (que têm temperaturas de fermentação mais baixas), é o descanso de diacetil.
O procedimento é bem simples. Basta você aumentar a temperatura de fermentação em cerca de cinco graus centígrados e deixar sua produção quietinha por um período de dois a quatro dias. Assim a levedura aumenta seu nível de atividade e remove o excesso de diacetil presente na cerveja.
Quando o diacetil é bem-vindo…
E como quase tudo na vida tem um lado bom… o diacetil em níveis baixos é considerado um on flavor (um sabor desejável, próprio do estilo) em alguns estilos como Stouts, Scotch Ales, Pilsner, English Bitters e Oktoberfests. Nessas aí o diacetil é um convidado, não um penetra.
Bom por hoje é isso, cervejeiro. Gostou da sacada cervejeira de hoje? Você também pode assistir ela neste vídeo do canal do Concerveja no YouTube.
Agora me conte: você já produziu uma cerveja com tanto diacetil que daria pra passar no pão e tomar com café? Deixe seu comentário por aqui! E lembre-se de compartilhar o post no Facebook!
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Muito bom, top demais !!!
boa noite Daniel mt boa sua sacada.
Existe uma conta há ser calculada no descanso do diacetil e gostaria de saber se levamos ela em consideração, que é:
TEMPO= 100 – (SOMATÓRIA DA MÉDIA DE TEMPERATURA)/TEMPERATURA DE DESCANSO
Esse seria o tempo do descanso né?
Gostaria deso saber se existe na legislação um índice de concentração aceitável para o diacetil, uma vez que esse composto se acumula no cérebro, gerando a proteína Beta Meloide causadora do mal de Alzheimer. Como posso detectar essa substancia em cervejas comerciais?
Olá, esses 5 graus a mais pode ser mesmo se passar do tange de trabalho da levedura? Por exemplo: se minha levedura tem um range de trabalho de 15 a 20graus e fermentei a 18 graus, posso elevar a temperatura para 23 graus para descanso diacetil mesmo estando fora do range?
Obrigado