Ésteres − Série Off Flavors (Falhas na Cerveja)
Pera, uva, maçã ou salada mista? O off flavor de hoje faz lembrar as brincadeiras de infância.
Calma que eu explico: Dependendo do éster produzido, sua cerveja vai ficar com o sabor de uma determinada fruta e provocar sensações e efeitos variados.
O interessante dos ésteres é que eles tanto podem ocasionar uma falha na sua cerveja, como proporcionar um on flavor, dependendo da concentração em que se encontram e do estilo da cerveja.
Eles são como aqueles personagens complexos, igual aqueles filmes que te deixam intrigado, na dúvida se são vilões ou heróis…
O protagonista de hoje pode “matar” a sua produção, mas também pode ter um papel grandioso no perfil sensorial da cerveja.
Leia o post para entender melhor em que situações isso acontece. Saiba também como os ésteres são percebidos e como se formam na cerveja, o que causa a elevação de seus níveis, como evitar essa falha e como aumentar propositalmente as concentrações do composto na cerveja.
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Como é percebido o éster na cerveja?
Os ésteres dão à cerveja um aroma e sabor frutado, que pode ser de banana, maçã, pera, morango, framboesa etc., dependendo do éster.
Quando presentes em altas concentrações no produto final, provocam um sabor de solvente, acetona ou esmalte de unhas nada agradável. Nesse caso, nunca são considerados on flavors.
O que são e como se formam os ésteres?
Os ésteres são compostos orgânicos que resultam da combinação de álcoois e ácidos graxos formados durante a fermentação da cerveja. A reação química que dá origem a eles é conhecida como esterificação.
As duas variedades de éster mais comumente encontradas no líquido precioso são o acetato de etila e o acetato de isoamila, que conferem, respectivamente, sabor de pera e de banana à cerveja.
Quais as causas do off flavor?
As causas do sabor frutado ou, em casos extremos, de solvente encontrado na cerveja estão ligadas fundamentalmente à cepa de leveduras utilizada e às condições de fermentação.
As leveduras têm uma enzima, denominada Acetato Transferase (AAT), que catalisa a produção de ésteres. Quanto maior a quantidade dessa enzima na levedura, mais esterificada será a cerveja.
Por sua vez, as condições de fermentação podem intensificar a esterificação pelo estresse das leveduras.
Confira a seguir a lista detalhada dos fatores que levam ao excesso de produção de ésteres na cerveja.
- Uso de cepas de leveduras selvagens ou com excesso de AAT;
- fermentação em temperaturas elevadas (isso faz com que as leveduras cresçam mais rapidamente e produzam mais ésteres; não é à toa que é mais rara a produção de ésteres em excesso nas Lagers – em que fermentação é feita em temperaturas mais baixas – do que nas Ales);
- elevação ou diminuição brusca da temperatura durante a fermentação;
- uso de baixas taxas de inóculo (que provoca uma reprodução acelerada das leveduras, em condições de “estresse”, aumentando a produção de AAT);
- oxigenação insuficiente do mosto (enquanto há oxigênio, a levedura consome, para se reproduzir, uma enzima precursora da produção de ésteres – a acetil-coenzima A; por isso é que se o mosto for bem oxigenado a produção desses compostos diminui);
- falta de nutrientes para as leveduras;
- mosto com alta densidade;
- uso de lúpulos que produzem notas frutadas.
Como evitar o excesso de ésteres na cerveja
Veja o que você pode fazer para que a sua cerveja não apresente essa falha:
- use cepas de leveduras “limpas” (neutras) e adequadas ao estilo da cerveja que você quer produzir;
- diminua a temperatura de fermentação (use como padrão cerca de 15 graus Celsius para as Ales e no máximo 10 graus para as Lagers);
- evite flutuações na temperatura durante a fermentação;
- oxigene bem o mosto;
- utilize uma boa taxa de inóculo;
- faça starter nas leveduras (pra que elas trabalhem sem estresse);
- reduza a densidade do mosto;
- evite usar lúpulos com notas frutadas (se isso não fizer parte do estilo, naturalmente).
Quando o sabor frutado é bem-vindo
Altas concentrações de ésteres não são desejáveis em estilo algum. Mesmo em níveis baixos, a presença desse flavor pode ser considerada um erro de estilo (na maioria das Lagers, por exemplo).
Por outro lado, em grande parte das Ales, especialmente nas britânicas e nas belgas, o efeito provocado pelos ésteres é muito bem-vindo, já que essas cervejas devem ser levemente frutadas.
O flavor também é apropriado nas American Darks, Doppelbocks (nas versões escuras) e Eisbocks.
Nas cervejas de trigo, o sabor e aroma de banana (causados pelo acetato de isoamila) são indispensáveis e aclamados como verdadeiros heróis.
Como você já percebeu, os ésteres são realmente personagens intrigantes. Alguns estilos dão a vida por eles; outros, querem vê-los pelas costas.
Para terminar, deixo uma dica especial para você que quer deixar um aroma suave de fruta na cerveja.
Primeiro, escolha uma cepa de leveduras que esteja de acordo com o estilo que você quer produzir. Depois, peça desculpa às leveduras e deixe-as um pouquinho estressadas.
Como?
Fazendo uma taxa de inóculo um pouco mais baixa e aumentando ligeiramente a temperatura de fermentação.
Entendeu? E ai, curtiu o post? Você pode conferir também essa sacada cervejeira no canal do Concerveja no YouTube.
E aí, você já produziu uma cerveja que parecia uma salada de frutas? Isso foi intencional ou não?
Se foi, parabéns. Do contrário, aproveite as dicas do post para não errar na próxima brassagem. E lembre de compartilhar a sacada de hoje no Facebook!
Até a próxima semana.
ref. FLAVOR DE ACETONA:
Bom dia! Depois de tanto pesquisar na internet, achei a resposta no seu artigo, muito grato! Faço diariamente para consumo próprio fermentações selvagens NÃO alcoólicas, de base doce e salgada. As de base doce são diluídas (tipo refrigerante natural) ou concentradas (tipo um mingau bem ralo). Nas concentradas tenho notado com frequência um flavor de acetona, eu imaginei que fosse por presença de aldeídos e fiquei preocupado quanto à toxidez. Mas pelo que li é acetato de etila, provocado por cepa selvagem e maior densidade do mosto. Então posso consumir sem problemas, correto?
Sou eng. químico aposentado, 61 anos, tenho uma boa base de química orgânica e fiz 1 cadeira de microbiologia industrial, mas nunca trabalhei neste ramo. Em fevereiro deste ano comecei a fazer as fermentações e tenho estudado o assunto.
Muito grato. Fred.